Como relatado na postagem anterior, a 34ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo começou no dia 22. Meu primeiro contato com o evento aconteceu na 30ª edição, mas não pude assistir nada. Essse ano tive a oportunidade de acompanhar de perto. Comprei um pacote que permite a retirada de ingressos (perante disponibilidade) durante no período vespertino, do meio-dia às 17h55. Para fazer bom uso, tentei assistir pelo menos dois filmes por dia. E descartei as possibilidades de arrumar uma programação para os finais de semana, pois o pacote só vale de segunda a sexta.
Não posso negar – para mim, é lindo ver pessoas pela Avenida Paulista com a sacola da Mostra ou mesmo a programação em mãos. Sem contar os crachás daqueles que compraram pacotes – a corrida de um cinema a outro não deixa tempo para guardá-lo. Apesar do serviço de bicicletas oferecido nesta edição, preferi correr de um cinema a outro. O momento é oportuno para matar a saudade de alguns cinemas ou conhecê-los, para quem participa da Mostra pela primeira vez.
Na primeira semana, assisti 11 filmes. Fiz minhas escolhas na tentativa de conciliar horários – o que acabou me prejudicando em algumas sessões, por dar pouca atenção às sinopses. Farei um breve comentário sobre cada filme e a sessão em si (estrutura da sala e público). As resenhas de cada um serão publicadas ao longo da semana. Para os cinéfilos presentes no evento até o dia 4, deixo minhas dicas. Segue a lista:
Retornos [22/10, no Reserva Cultural]: O tema é batido – conta a experiência de Álvaro ao voltar para sua cidade natal após 10 anos, para o enterro do pai. Como é de praxe, a volta do personagem interpretado por Xavier Estévez desencadeia uma série de acontecimentos que não o deixam sair de lá tão cedo. É o primeiro longa-metragem do diretor colombiano Luis Avilés. Talvez por medo de inovar em seu primeiro trabalho, ele optou por um filme “certinho”. E por certinho, entenda – com começo, meio, fim – tudo bem explicado, para não deixar dúvidas ao espectator. Tal formato quebra expectativas e deixa o filme um pouco óbvio. [Foi uma das primeiras sessões da Mostra. Não houve problema com a exibição.]
Revolução da Luz Vermelha [25/10, Espaço Unibanco]: Shunzi é expulso da casa de sua mulher ao perder o emprego. Ao voltar para a casa dos pais, sem esperanças, acaba encontrando um velho amigo que lhe propõe algo para “recomeçar”: abrir um sex shop para não ter mais problemas com dinheiro. O filme procura mostrar uma China bem humorada. De fato, é um filme bem engraçado. Mas parece se perder em certo ponto – tanto que acaba sem acabar. Recomendo apenas para quem não exige seriedade e precisa rir um pouco. [Não houve problema com a exibição. O diretor estava presente.]
Cópia Fiel [25/10, Cine Livraria Cultura]: Duas pessoas se encontram na Toscana – ele, escritor; ela, dona de uma galeria de arte. Parece familiar? A sinopse lembra um dos filmes de Richard Linklater – Before Sunset. Mas, além do local não ser o mesmo, já imaginei algo diferente por abordar personagens mais velhos. A princípio, o filme é muito bom. Os diálogos são interessantes. Mas a história não se desenvolve bem. Seria um pouco absurdo, porém, perder tempo falando sobre direção e roteiro, por exemplo, quando se tem tamanha atuação de Juliette Binoche. Além do excelente desempenho, ela se desdobra, falando francês, inglês e italiano – com pronúncias impecáveis. Para ninguém colocar defeito. [O cinema mudou de nome, mas tudo continua igual. Só uma ressalva: a sala lotou e algumas pessoas ficaram sentadas no chão.]
Bróder [26/10, Espaço Unibanco]: Macu, Jaiminho e Pibe passaram a infância no bairro Capão Redondo, em São Paulo. O filme mostra o reencontro dos três amigos. O primeiro longa-metragem dirigido por Jeferson De é só mais uma prova da existência de bons filmes brasileiros. Poisé, integro o grupo de pessoas que dá atenção a trabalhos nacionais – e costumo gostar dos resultados. Logo, sou suspeita para elogiar Bróder. Independente da minha opinião pessoal, é uma película bem feita. Vale a pena assistir. [Sem problemas com a exibição. O diretor estava presente.]
Modra [26/10, Unibanco Arteplex, Shopping Frei Caneca]: Lina mora no Canadá e resolve viajar durante as férias. O local de destino é Modra, na Eslováquia, onde será recepcionada por familiares que vivem lá. É preciso ser muito insensível para sair da sessão sem um sorriso no rosto. A simplicidade da história serve como base para despertar a sensação de felicidade a cada cena. Um filme delicado, com lindas paisagens de um país que até então eu não havia visto em obras cinematográficas. [Sem problemas com a exibição. A diretora Ingrid Veninger e a atriz Hallie Switzer, muito queridas por sinal, estavam presentes.]
Não Me Deixe Jamais [27/10, CineSESC]: Ruth, Kathy e Tommy cresceram juntos em um internato. Local que os preparava para um triste destino. É difícil falar sobre ele sem dar spoilers, embora o trailer já conte uma das partes mais dramáticas do filme. Para mim, foi uma tortura psicológica. Como se alguém pegasse meu emocional e fizesse graça com a sua fragilidade. Sou fraca para filmes assim, o que me ajudou a detectar um dos objetivos de Não Me Deixe Jamais – deixar de lado a parte “técnica” e cheia de explicações para fisgar o público pelo lado mais sensível. E é bem extremo – ou você gosta muito, ou não vê graça. Recomendo, por esse motivo, uma ida ao cinema sem expectativas. E se você chora com facilidade, reserve um estoque de lencinhos para te acompanhar. [Era incrível o silêncio ao fim da sessão – acabou sem muvuca e cheio de gente com os olhos inchados de tanto chorar.]
A Árvore [27/10, Unibanco Arteplex, Shopping Frei Caneca]: Uma família vive em um vilarejo da Austrália. Após a morte do pai, a mãe precisa lidar com a dor da perda e cuidar dos quatro filhos. Para complicar, a pequena Simone acredita conversar com o pai toda vez que sobe na grande árvore presente na frente da casa. Ao que tudo indica, é um dos queridinhos da Mostra. A sessão esgotou e muitas pessoas saíram satisfeitas. Fui assistir pela Charlotte Gainsbourg, mas não considero mais um motivo para conferir este filme. A ideia era boa, e o apego de Simone pela árvore era comovente até certo momento. Mas torna-se cansativo e irritante. [Projeção também sem problemas. Algumas pessoas sentaram no chão, traço típico de exibições com ingressos esgotados.]
Ex Isto [28/10, Unibanco Arteplex, Shopping Frei Caneca]: Uma mistura de Paulo Leminski com René Descartes. Promissor, não? Mas decepciona. A premissa era bastante interessante, mas a lentidão do filme chega a dar preguiça. Algumas cenas, porém, foram bem trabalhadas e valem pelo resto do filme. [Sem problemas na projeção.]
Comida Fria [28/10, CineSESC]: Christer se lembra do dinheiro deixado no bolso da calça que acaba de colocar para lavar na máquina. Para desligá-la, desativa a chave geral. A pequena “arte” desencadeia uma série de infortúnios para as pessoas da vizinhança. Uma amiga até brincou quando acabou: “É um filme sobre babacas”. De fato. Não consegui enxergar profundidade, muito menos drama, em nenhum personagem. O filme não me deixou nem desesperada com tamanha ignorância: só lamentei. [Sem problemas na projeção.]
Uma Vida, Talvez Duas [29/10, Unibanco Arteplex, Shopping Frei Caneca]: Mais uma para a lista de filmes difíceis de comentar sem dar spoilers. A história conta o desenrolar da noite de Matteo, que corre para o hospital para acudir um amigo. Dirigido por Alessandro Aronadio, procura dialogar com o espectador ao oferecer duas possibilidades para os desdobramentos da história. Tudo parecia perdido após os três últimos filmes assistidos, até Uma Vida, Talvez Duas entrar para minha lista da Mostra. Ótimo enredo, intrigante, e envolvente. [Sem problemas na projeção. Muita gente entrou depois, provavelmente por conta do horário {12h}. Mas nada que tenha atrapalhado.]
William S. Burroughs: Um Retrato Íntimo [29/10, Reserva Cultural]: O título fala por si. Um documentário sobre um dos autores mais conhecidos da geração Beat – William Burroughs. Excelente trabalho do diretor Yony Leyser. Ele soube explorar a relação do escritor com pessoas próximas e a forma como serviu de influência para outras obras, sem ser cansativo. Entre um depoimento e outro, inseriu alguns trechos de entrevistas feitas com Burroughs – muito bem escolhidas, por sinal. [Mantive essa parte sobre a sessão até o fim para criticar o último filme da semana. Uma das melhores películas da minha lista, sem dúvidas. Contraditoriamente, a pior sessão. Por tudo. A legenda era pequena, e o posicionamento abaixo da tela prejudicou a leitura. Muita gente trocou de lugar ao longo do filme para ver melhor. Muitos sentaram no chão. Nunca vi, também, público tão ruim – pessoas que reclamavam só de ouvir o rangido de uma cadeira. O respeito e o bom senso mandaram notícias.]